Umberto Eco, neve em Nova Iorque e Netflix interferem no negócio de TV

A morte de Umberto Eco foi destaque no JN: gente boa demais, mas grande parte desconhecia a sua existência. Exceto aqueles que gostaram da reportagem sobre os novaiorquinos aproveitando a neve. Depois ainda reclamam que as pessoas estão indo para a internet...

Quem, como eu, defende que a TV não vai acabar com o expansão das novos tecnologias digitais, sabe que ela, no mínimo, está sofrendo. Quem costuma ler as fofocas de bastidores das TVs (como eu), sabe que o facão anda comendo solto, e as despesas estão sendo cortadas. As emissoras ainda estudam maneiras de se adaptar aos novos tempos. Mas a TV  não é um videolaser ou as fitas Betamax, que dependiam de aparelhos específicos. Televisão é muito mais que a caixa de imagens, é um conceito e uma experiência, e esses podem ser contemplados em variados outros ambientes.

Um novo estudo internacional, relatado pela Folha, continua a trilhar os fatos que mostram a internet afetando ao negócio da TV. As exibidoras de conteúdo via internet (conhecidas por OTT "over the top"), que tem a Netflix como principal exemplo, mas longe de ser única, podem estar por trás dos desligamentos das TVs pagas. Aí é óbvio, certo? Porque vou pagar por conteúdo audiovisual se já estou pagando pela internet?

Mas esse fato só reforça que televisão e veículo de transmissão de televisão não são a mesma coisa. Assim como cinema e filme são coisas distintas, embora o segundo também seja chamado pelo mesmo nome do lugar onde se assiste (alguém conhece uma "revista de filme"?). Ou seja, não se tem uma TV, mas várias. E não se assiste TV em um só aparelho, mas em vários. No caso da pesquisa, o que se mostra é que as pessoas querem assistir TV, mas pagar menos por isso.

O Brasil é um ótimo caso de estudo, pois os preços de TV paga são um absurdo. Na realidade, não conheço a planilha de custo e já li que os conglomerados de canais (que reúnem pacotes como a Globosat) é que enfiam a mão. Certamente, o valor dos impostos agregados também deve ajudar. O que importa, no entanto, é que grande parte da população gosta de assistir os canais abertos, com suas novelas e programas de auditório, e estava, paulatinamente, migrando para as TVs pagas em busca de conteúdos novos e segmentados. Bem, as OTTs e a expansão da internet banda larga andam resolvendo esta demanda. Então, para quê pagar pela TV paga?


Não há dúvidas como o cinema mexeu com o rádio, a TV mexeu com a televisão e ainda o videocassete mexeu com a TV. Mas, em todos os casos, embora o negócio tenha sido alterado, ele permanece e, no caso do cinema, bastante fortalecido. Séries de TV, antes esquecidas, voltaram graças aos OTTs, e voltam a ser produzidas pelas emissoras para, depois, irem para os OTTs...

Bom, e o que o Umberto Eco e as neves de Nova York têm com isso?

É inegável que ainda há um bom caminho para as TVs se adaptarem adequadamente, e ainda apanham. Todo mês aparece o destaque da perda de audiência do Jornal Nacional. Sem dúvida, o telejornalismo, como o jornalismo em geral, tem apanhado mais da internet, haja vista que sua velocidade ideal não consegue acompanhar a velocidade real do próprio internauta ávido pelas notícias.

O Jornal Nacional até tem tentado mudar, colocando a turma mais despojada, como a internet tem vendido o jornalismo, entre outras iniciativas. Mas mudar a fachada não altera o produto. Sempre fui um apaixonado por Umberto Eco, muito mais pelas suas contribuições no campo da comunicação e da ciência. Pelo jeito, a editoria do JN também gostava dele. Afinal, dedicar uma parte considerável do principal telejornal do país para o seu falecimento é ignorar que, provavelmente, 90% da sua audiência o desconhece e que sua vida e morte pouco interessa. Esse é só um exemplo, pois personalidades ainda mais desconhecidas costumam aparecer no obituário da Globo. Entenda-se, não é exclusivo da Globo, mas o JN serve como o ícone que representa a maioria..

E aí também tem as belas reportagens dos novaiorquinos se divertindo na neve! Gostaria até de fazer uma piada, mas temo ser um desrespeito à audiência majoritária que anda pensando em como pagar pelos suscetíveis aumentos de ônibus (alguns para ir e vir de Nova York, um bairro da periferia de BH) e, se sobrar algum, comprar um ventilador em 12 prestações.

Às vezes, a escolha das matérias me parece ser feita por um clube de amigos, tipo mostrar o quanto os editores são sofisticados. Aí fica difícil manter mesmo a audiência quando ela pode simplesmente desligar o aparelho e checar como andam as coisas no seu mundo real, pelo celular comprado em prestações suaves.

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