700 MHz: o Pré-Sal da Radiodifusão
Estamos em plena disputa político-econômica de quem vai
ficar com a herança dos atuais canais das TVs abertas analógicas quando
migrarem para a TV Digital, os tais 700 MHz reservados no espectro brasileiro
para o trânsito destes sinais.
De um lado as poderosas e recém-naturalizadas telefônicas,
dez vezes maiores que suas adversárias, as oligárquicas empresas de
radiodifusão brasileiras.
É uma disputa que está passando ao largo daqueles que não
entendem, mas também daqueles não querem entender por puro ranço tecnológico.
Cada vez que vejo notícias
da imprensa especializada, é um lado que envia sua bomba. Radiodifusores
defendem as emissoras de TV e rádio alegando desde a tecnicidade das novas
tecnologias, como 4K e 3D, até as ciências humanas, como a nossa cultura de TV gratuita.
A turma dos telefones, igualmente, diz precisar de mais espaço para as próximas
gerações, como a 4G e a ampliação do tráfego de dados para os smartphones da emergente
classe C.
Neste samba do criolo-doido, que mistura sociologia com
tecnologia, falta no enredo o que deveria ser a chave da harmonia: trata-se do
espectro público, a série de faixas no espaço brasileiro que pertence a todos e
que o Estado outorga para exploração em troca de contrapartidas financeiras e
sociais. Igualzinho o solo brasileiro e as milhas marítimas, por exemplo.
O trágico é que, sendo igualzinho, não se usam as mesmas
medidas. Ora, se a tecnologia está maximizando a utilização desde bem tão
precioso, como acontece com a exploração do petróleo em faixas geográficas
nunca antes exploradas, é de pensar e exigir já, antes de qualquer coisa, um
plano de ‘pré-sal’ do espectro brasileiro, em especial os 700 MHz. Afinal,
quanto valem essas faixas? Para onde irá esse dinheiro? Para a comunicação
pública? Ou para a educação? E as empresas que vão explorar? Qual a
contrapartida social? Instalação de rádios comunitárias? Oferecimento de canais
de televisão locais para uso da sociedade? Infraestrutura tecnológica para as
escolas? Não sei o que é, mas algo tem que ser.
Não estamos mais no governo militar, que deu loteou o
espectro em troca de apoio e sustentação política e midiática. Portanto, se as
telefônicas e os radiodifusores quiserem realmente travar um bom debate sobre o
uso dos 700 MHz, poderiam bem que começar com o que pretendem dar de retorno
para a sociedade dona deste espaço. No mínimo, trariam a atenção de uma opinião
pública que poderia ajudar em seus argumentos, ao invés de usarem termos
técnicos que ninguém entende ou argumentos sociológicos que ninguém acredita.
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