Iniciação Científica para salvar o Ensino Médio!
Alunos e Educadores premiados pela Nasa em exemplos espe(a)ciais de como o Ensino Médio pode fazer sentido. Fotos: Sesi e IFSC |
A Iniciação Científica é associada ao ensino superior, na lógica que é apenas nessa fase que os jovens conseguem desenvolver um pensamento científico mais apurado. Ora, conforme tentei defender anteriormente, esse é um dos motivos da decadência do Ensino Médio e a sua altíssima taxa de evasão: não acreditar que essa rapaziada já está lá na frente no desenvolvimento do pensamento abstrato e o que eles menos precisam agora é repetir os métodos do Ensino Fundamental. Não é preciso inventar a roda: menos em decoreba e mais experiências, que é o que a garotada valoriza. Se fizer sentido quando a informação é introjetada na sua realidade, ela se transforma em Conhecimento e esses meninos e meninas viajam.
Literalmente! Para o espaço e além! E mais de uma vez!
Que tal os alunos do Ensino Médio do Instituto Federal de Santa Catarina, em Xanxerê, que emplacaram uma moringa na Estação Espacial Internacional, para servir como um filtro de água em um ambiente sem gravidade? E aqueles outros do Centro de Atividades Mozart Soares Filho, do Sesi de Goiás, que criaram um especial e espacial chiclete com pimenta para ajudar os astronautas que perdem o olfato (e podem comer algo estragado ou simplesmente não sentir um vazamento de gás)? Todos premiados pela NASA, diga-se de passagem (espacial).
Cá entre nós: uma moringa e um chicletes! Não é bem coisa de Ensino Médio? Não consigo visualizar um prêmio Nobel desenvolvendo uma pesquisa com essas ideias...
Estou certo que há inúmeros outros exemplos. Esses são só os espaciais de 2019! Sei que há uma conjunção de fatores que levaram esses meninos ao espaço, mas também não precisa que todo projeto queira resolver os problemas dos astronautas. Ao contrário, não são poucos os problemas do entorno da escola, em todas as dimensões: econômicos, sociais, ecológicos, estruturais... Da mesma maneira, os próprios alunos necessitam de um olhar atento para os seus próprios problemas e, quem sabe, ajudar a si e aos demais. Acaba de sair um dado alarmante: mesmo com todas as tragédias de feminicídio que estamos vendo, os suicídios são a principal causa de morte de mulheres em casa. Sabe aquelas desprezadas aulas de Sociologia e Filosofia? Ao invés de tentar enfiar dolorosamente Emile Durkheim na cabeça dos jovens, porque vai cair no Enem, que tal partir das dores pessoas e sociais dos próprios jovens para entender tais tragédias (e, sim, olhando por cima dos ombros dos gigantes, como diriam os colossais Bernardo de Chartres e Issac Newton)?
Ou seja, qualquer temática pode servir para projetos de iniciação científica, e qualquer motivo pode levar a rapaziada a buscar a construção do seu conhecimento, desde que devidamente orientada pelos seus educadores. São os professores que têm conhecimento e o pulso do que é preciso aprender nesta etapa, associando ao que está rolando no entorno e no coração do seu alunato, atento e aberto para ver e escutar (não só verbalmente) o que eles dizem.
Não é fácil, pois há aquela armadinha citada no início do artigo: a escola não quer/não está preparara/não sabe/não tem coragem para ir contra a sociopatia do Enem, porque têm pais/secretaria/falta de experiência no cangote cobrando a aplicação neurótica de uma nota em uma prova que cobra decoreba com amadurecimento de vida, coisas em grande parte desassociadas. Mas a saída é tentar, aqui e ali, ir pervertendo a estagnação mantida por esse dilema, de projeto em projeto ir modificando os hábitos educacionais e pedagógicos.
Entendo, não é mesmo nenhuma novidade trabalhar com projetos no Ensino Médio. Estranho é pensar que experiências em sala e fora dela, trabalhos por projetos e iniciação científica devem ser momentos pontuais, algo a ser feito após e entre as aulas expositivas, quase que servindo como uma espécie de ilustração do dito ou, pior, um 'descanso' da sala de aula. Afinal, para onde foi a 'metodologia ativa' de Sócrates e Aristóteles onde, primeiro olhamos ao redor, formulamos perguntas, conversamos, e depois é que vamos buscar as respostas utilizando o desenvolvimento de um pensamento científico, com hipóteses, retórica, experimentações, retornos, novas hipóteses e, por fim, conclusões? Alô, nossos colegas da Educação Infantil, venham nos resgatar e devolver para caminho do qual nos perdemos!
Coloco 'metodologia ativa' e pensadores clássicos gregos na mesma frase com provocativa intenção. Se aqui recomenda-se o trabalho por projetos, não é porque venero às novidades do tipo "Project Based Learning (PBL)". Isso me dá preguiça, pois todas essas novas siglas e 'metodologias ativas' nada têm de novo. Já eram recomendadas por educadores desde o final do Séc. XIX por aqueles que acreditavam que o aluno é que deve ser o agente da construção do seu conhecimento. Para mim, essas sopas de letrinhas, de preferência em inglês para ficar mais chique, são apenas uma maneira de não pagar royalties autorais e e de tutelagem para sujeitos como John Dewey, Maria Montessori, Lev Vigotski, Jean Piaget e Paulo Freire, turminha que não pode aparecer na foto das políticas liberais da Educação.
Portanto, há soluções para o Ensino Médio. Não precisa ir (só) ao espaço para procura-las. Elas já andam por aí, e basta escrever palavras-chaves neste sentido em sites como YouTube, Canal Futura e Todos pela Educação para achar exemplos inspiradores. Se bem que, se os alunos de Xanxerê e de Goiânia tivessem colocado "moringa" e "chicletes" junto com NASA, não iam achar nada. Ou seja, da cabeça abstrata desses jovens é que os astronautas poderão beber água limpa, sentir o paladar do seu espaguete (ou notar se ele está queimando). De nenhuma experiência pode surgir a experiência. E, com ela, o Conhecimento e o sentido do Ensino Médio.
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