Não existe almoço (nem internet) grátis


Dilma e Zuck: não curti. Crédito: EBC
O Facebook quer dar internet grátis para os países pobres. Nós estamos na lista À princípio, como dito pelo próprio Mark Zuckerberg, criador do Facebook, "quem poderia ser contra isso?" Bem, a Índia foi contra e proibiu o projeto "Internet.org", a tal da internet grátis. Então, se não é tão simples assim, quais são os lados desta história? O que seria bom para o contexto brasileiro? Mas adianto que, como todo bom mineiro, a desconfiança do moço da cidade grande querendo dar alguma coisa sem volta é por demais grande!

A questão nem é tão complicada assim: a Internet.org daria a internet até na página 10. A internet estaria liberada para um conjunto de sites predeterminados e que, de acordo com o Facebook, entre eles uma série ligada aos interesses sociais, como as páginas dos poderes públicos. As demais, é claro, seriam aquelas de interesse, e das parceiras, do Facebook.

É como ter TV paga de graça em casa, mas só os canais das TVs estatais e das emissoras chegadas da operadora.

Claro, a questão da interatividade da internet é bem maior que a TV paga, e oferecer essa interlocução para o cidadão, sem custos, realmente é um importante atrativo. Mas, como dito no título, o negócio é saber a que preço, já que não tem almoço grátis e o Facebook pode ser tudo de bom, mas não é uma entidade filantrópica.

"Quando você não paga por um produto, você é o produto", disse Neide Oliveira, procuradora da República e especializada em crimes cibernéticos, em entrevista à revista Época. Não é preciso muito para entender o que o Facebook ganha com o acesso de milhões de cidadãos, gente que majoritariamente está fora de sua rede e, portanto, de seus bancos de dados de comportamento e consumo, o seu produto principal a ser vendido.

Mas, atenção, não me parece ser esse o problema, e não sou desses contra o Face e sua forma de negócio. Me sinto razoavelmente confortável em oferecer meus dados em troca das facilidades que Google, Face e superamigos têm me proporcionado no mundo digital. Acredito que, confortavelmente ou não, os seus demais clientes também, senão não manteriam suas contas nas suas diversas plataformas de comunicação.

O problema está na própria ideia de internet. Internet livre, sem qualquer empecilho para que eu navegue por onde eu queira, sem restrições ou "pacote de canais/sites". Essa foi uma importante conquista do Marco Civil da Internet e um dos poucos pontos de orgulho brasileiro nos últimos tempos, dado o destaque e a inveja que tal legislação têm sido comentada no exterior, mesmo em países com o digital mais presente no cotidiano, como os EUA.

Portanto, o medo é que a Internet.org vire uma espécie de política pública substitutiva da ideia de internet ampla, geral e irrestrita, algo como "é melhor ter uma internet limitada do que não ter internet nenhuma". Ou seja, o governo não dando conta de oferecer internet livre para a população, ou mesmo para suas obrigações sociais, como escolas e centros de saúde públicos, encontre no Internet.org uma solução paliativa que enviese toda a ideia do Marco. Fora que sabemos que as soluções paliativas dos governos têm um péssimo hábito de se manterem permanentes e alterarem, inclusive, a percepção do cidadão do que é o seu verdadeiro direito.

Em resumo, o perigo é quem ter um naco de internet pelo Facebook, acreditar que é isso mesmo, e ainda agradecer ao moço do estrangeiro pela benevolência. Sob os olhares permissivos dos governos que deveriam proteger e ampliar os seus direitos, legais e morais.

Não acredito que é um caso de proibição, como aconteceu na Índia. Sem problemas para quem quiser usufruir. Mas certamente não é o caso de substituição de uma política pública desenhada e aplicada pela promulgação do Marco Civil da Internet. Espero que a foto daí de cima não signifique isso!

Por outro lado, se esse post não for apagado e não tiver restrição de circulação pelo Facebook e demais plataformas, podemos ter uma certa esperança na democracia virtual proposta por Zuck.


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