Projetos educativos premiados não usam tecnologia eletrônica
Essa é ainda a principal tecnologia adotada pelos professores e alunos de projetos educacionais premiados. Crédito Pixabay CC0 Public Domain |
Eu tenho uma grande preguiça quando abrem a caixa de ferramenta para falar mal das escolas! Com a recente entrada na pauta da baixa qualidade da nossa educação como um todo - um fato, sem dúvidas - acaba por levar incautos a pseudo autoridade de sair dizendo que a escola é também uma porcaria como um todo. Misturam tudo e acabam por jogar fora a água do banho com a criança junto. Junto também está a ideia que a escola vai mal porque não está sintonizada às novas tecnologias, que os estudantes agora só aprendem se houver um aparelho eletrônico ligado à sua frente. Arf, quanta bobagem!
Primeiro, se é fato que os números brutos nacionais mostram uma educação horrorosa em geral, tais números não mostram que há centenas de milhares de professores pelo Brasil afora fazendo um trabalho exemplar tentando, justamente, vencer as dificuldades de um sistema que parece querer trabalhar contra. Entre os depoimentos de colegas, artigos científicos, relatórios de experiências e premiações de educadores, não faltam projetos brotados na aridez que se transformou a aplicação de uma política educacional justa e criteriosa.
Certamente posso estar condicionado a um otimismo de educador, mas, para cada vez que escuto ou leio alguém metendo o pau nas escolas, me lembro de algum bom exemplo que escutei ou li recentemente. Mesmo eu quando faço as críticas, penso que existe alguém ali dentro tentando fazer algo diferente e, quem sabe, minhas parcas observações vão apenas respaldar sua iniciativa e levar a um pensamento do tipo "eu sei, bobão, estou tentando mexer nisso aqui, mas vou mostrar ao coordenador para ele ver que não sou só eu que penso assim".
Da minha parte, fico ainda mais angustiado quando aponta-se a falta de tecnologias eletrônicas como uma das fontes das mazelas da educação. Como se o laboratório de informática, ou uma distribuição de tablets, fossem resolver todos os problemas. É certo que o desprezo que algumas escolas - e os orçamentos - dão a tecnologia eletrônica não ajudam, mas também nessa especificidade os professores têm demonstrado criatividade e, melhor ainda, demostrando para os seus nativos digitais que se pode aprender e apreender o mundo sem precisar apertar um botão de 'on'.
Como exemplo, tive a curiosidade de pegar os 9 vencedores da 18a. edição do Prêmio Educador Nota 10, em 2016. Apenas quatro usaram computadores e, desses, três utilizaram internet, o que mostra que os professores sabem muito bem se virar com a carência eletrônica. Ou simplesmente não deram bola - quando não frontalmente combateram - a ideia de que a escola deve estar conectada em todos os momentos.
Dado o sucesso que os projetos alcançaram com os alunos, percebe-se que, como dizem os mestres da educação, a criança e o jovem querem é aprender, o que acontece caso ele perceba sentido no que está aprendendo e fazendo. Seu apego pela tecnologia eletrônica pode até ter esse incentivo, mas pode perfeitamente acontecer com outros estudos e aplicações de técnicas que não precisem de uma tomada para funcionar.
O vencedor foi um projeto que utilizou uma série de tecnologias, mas a internet só entrou no momento final, quando os alunos precisaram de referências para montar um protótipo de um filtro para água (que foi criado e distribuído para 56 casas). Foi assim com as demais, o suporte eletrônico apenas agregou à tecnologia tradicional (escrita, desenhos) um aperfeiçoamento. Só um projeto teve exclusiva dependência das tecnologias eletrônicas.
Prêmio Educador Nota 10 2016
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Disciplina
|
Tecnologia
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1º
Lugar
Filtrando
as Lágrimas do Rio Doce
EEEFM
Antônio dos Santos Neves
Boa
Esperança (ES)
Prof.
Wemerson da Silva Nogueira
|
Ciências
9º
ano
|
Entrevista
Análise
em Laboratório
Seminário
Visita
Técnica
Prototipia
Internet
|
Tartarugas
Marinhas
EM
João Francisco dos Santos
Mata
de São João (BA)
Profa.
Débora Gomes Gonçalves
|
Alfabetização
2º
ano
|
Escrita
|
Leitura
Dramática
EE
Prof. Fernando Brasil
Tabatinga
(SP)
Profa.
Karin Gröner
|
Língua
Portuguesa
5º
Ano
|
Leitura
dramática
Gravação
em audio
|
Matemática
e Games? Eis a Questão!
EM
Irmã Catarina Jardim Miranda
Senador
Canedo (GO)
Prof.
Greiton Toledo de Azevedo
|
Matemática
6º
Ano
|
Computador
Softwares
|
A
Construção da Identidade
EMEF
Profa. Marili Dias
Vila
dos Palmares (SP)
Prof.
Fabio Augusto Machado
Profa.
Adriana da Silva Ferreira
|
Geografia
6º
ao 9º Ano
|
Entrevistas
Debates
|
Mapas
do Tesouro que São um Tesouro
EMEB
Coronel Francisco Rodrigues Barbora Itatiba (SP)
Profa.
Selene Coletti
|
Matemática
1º
Ano
|
Desenhos
Jogos
Virtuais
Softwares
(Paint/Word)
|
Pé
com Café
CEI
Adhemar Garcia
Joinville
(SC)
Profa.
Marilei Roseli Chableski
|
Educação
Infantil
|
Encontros
Questionário
Oficina
de brinquedos
|
Por
um Fio de Memória
EM
Suzana Albino França
Lages
(SC)
Prof.
Carlos Eduardo Canani
|
Língua
Portuguesa
8º
Ano
|
História
Oral
Escrita
|
Lap
Gup: Nossa Casa, Nosso Lar
EIEFM
Sertanista José do Carmo Santana
Cacoal
(RO)
Prof.
Luiz Weymilawa Surui
|
Geografia
6º
ao 9º Ano
|
História
Oral
Mapas
Maquetes
Museologia
|
Claro, não podemos relaxar. Sabe-se que tais exemplos, cada vez mais numerosos, acabam sendo um gota no oceano que é a imensidão da educação brasileira. Nada redime o papel do Estado em coordenar a educação, tanto na democratização da formulação e aplicação das políticas públicas, como, inclusive, na disseminação dos bons exemplos. Assim como todos devem continuar levando em consideração a tecnologia eletrônica como um componente cada vez mais presente no cotidiano e, portanto, passível de estudos de
Falta muito mais essa valorização desses projetos, uma disseminação de suas metodologias e uma ampliação substancial do reconhecimento desses professores criativos, do que propriamente a entrega de um pacote de medidas divinas que, vindas de cima para baixo, coloquem nossa educação nos trilhos.
O que se vê pelo país é que o de baixo para cima faria muito mais sentido.
O Prêmio Educador Nota 10 é promovido pelas fundações Victor Civita, Roberto Marinho, Leman e da Somos Educação, com o apoio da revista Nova Escola. São mais de 3 mil inscrições, que passam por um processo seletivo rigoroso, e que, anualmente, percorre o país em busca de projetos educativos inovadores e criativos. Há outros prêmios por aí, também importantes, mas desconfio que o resultado do levantamento sobre o uso de tecnologias não seria muito diferente.
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