As 10 Previsões para 2020 do Tio Cláudio
Previsões de início de ano são como horóscopos. A gente faz uma força tremenda para desdenhar, mas a tentação de consultar parece ser maior... Nem que seja para a gente ler e fazer um muxoxo metido de desaprovação. Eu até gostava muito, antes mesmo de ser um cientista, aliás, acho que fui ser cientista porque gostava de tentar adivinhar o que ia acontecer. Minha decepção com esse verdadeiro vicio social de início de ano é que, ou eu esquecia o que tinha sido previsto no ano anterior, e/ou não achava um balanço sobre os acertos que o sujeito ou a instituição tinha feito para fazer uma estatística do tipo 'caramba, acertou em grande parte' ou 'errou feio'. Concluí que estavam mais para o 'errar feio' do que para o 'caramba'. Afinal, se o sujeito tivesse acertado, ia fazer questão de tocar trombetas.
Uai, então o que eu estou fazendo agora? Ora, cheguei a conclusão que as previsões são um prazer pessoal muito mais para os autores delas do que para orientar quem lê. Aprendi isso com sujeitos como o Juca Kfouri e Milton Neves, e outros cronistas que, mesmo vigiados por essa massa de leitores que vão de raivosos aos mais zoadores do planeta, teimam em chutar suas previsões sobre jogos. Para mim, eles estão é se divertindo, e muito mais com os erros do que com os acertos.
Daí, pensei dentro da minha campanha brancaleônica por uma divulgação científica menos chata, porque não colocar a cara a tapa e encaminhar alguns chutes para 2020? Mas, com a promessa de dar uma estatística em 2021 da quantidade de acertos. Certamente, os palpites serão nas áreas que entendo um pouco, e não sobre quem será o campeão brasileiro, e menos ainda quem vai ganhar a eleição em Belo Horizonte. Ok? Então, vamos lá:
Educação: vai bombar em 2020! Mas não como os gestores da educação formal gostariam. 2020 continuará na toada de crises crônicas, no país e no mundo, uma aposta com tristeza no coração. Mas, em crises de perspectivas e de crenças institucionais, que é o que acredito que são neste momento ("afinal, para onde vou e o que devo fazer, já que não posso mais contar com ninguém para me ajudar?"), resta apenas olhar para si mesmo e tentar se capacitar. Nas grandes revoluções tecnológicas, quem detinha os meios de produção tomou para si essa tarefa (com resultados sociais terríveis), sob o risco de ficar sem mão de obra barata. Agora, Estado e empresas estão pouco se lixando para a Educação, pois entrou na equivocada onda de que a evolução da humanidade é pelo consumo, e não pelo melhoramento intelectual. Mas continuará e se ampliará uma outra onda, a da percepção (em parte, equivocada), que não preciso do Estado e das empresas para me educar, já que os novos modelos - em grande parte gratuitos ou muito baratas - podem me ajudar na construção do conhecimento que necessito. Assim, Educação a Distância continuará sua tendência a deixar de ser o patinho feio da educação formal e ganhará status semelhante ao presencial (mas não pelas mãos das tradicionais universidades, que ainda não entenderam o que é fazer EaD juntando qualidade e capacidade de pagamento de quem precisa estudar). Cursos gratuitos também serão mais populares e com credibilidade, e muito video no YouTube, mas agora com outras plataformas que vão surgir em 2020 para rivalizar. A Humanidade gosta de ensinar e ser ensinada, e está perdendo a paciência com essa relação formalista ancorada nos séculos passados. Não há dúvidas: se você quiser, de verdade, aprender sobre algo que é ensinado nas escolas (e pagando caro por isso, mesmo nas públicas, dado os custos operacionais para frequentar), você acha fácil na internet. Quanto mais as pessoas continuarem a perceber isso, mais desacreditada continuará a escola formal, essa que foca no conteúdo já que disponível em qualquer dispositivo eletrônico. O que poderá acontecer (e torço para isso), é que a educação formal começará a perceber que seu prejuízo, visualizado por salas vazias e/ou alunos cada vez menos participativos, só poderá ser diminuído quando voltar a ser percebida como algo relevante, e não uma instância treinadora de prova de Enem. E qual seria essa relevância? Aquela onde começará a priorizar a relação entre professores (papel insubstituível, em qualquer das revoluções humanas), a proposta de conhecimento a ser construída, os alunos e o seu contexto. O conteúdo, ora, o conteúdo é apenas o que nutre essa relação e a torna maior, como um piquenique onde as pessoas saem alimentadas, mas mais ainda com a sensação de uma experiencia que levará para a sua história. Quem é religioso, poderá fazer a mesma metáfora com seu culto preferido. A boa notícia é que a BNCC (Base Nacional Comum Curricular) dá um bom direcionamento para que as escolas mudem o registro tradicional de ser uma Barsa falante para um GPS interativo. A má notícia é que não acho que a BNCC vai 'pegar' esse ano. Escutaremos pouco sobre ela, e boa parte das escolas vai dizer algo como 'estamos nos adaptando'.
Inteligência Artificial: tema tecnológico do ano! Vamos ouvir muito sobre IA, mas acredito que já superamos (com ou sem razão) a ideia que o robô do Exterminador do Futuro é o que chegará em breve (o que não quer dizer que não chegará um dia....calafrio na espinha!). Os tais gadgets como assistentes virtuais serão um objeto de desejo, mas também ouso dizer que não vão pegar como os fabricantes desejam. A discussão sobre proteção de dados (veja abaixo), a necessidade de trocentos outros gadgets para acoplar, a nossa pouca paciência com configurações e, essa é engraçada, paciência ainda menor com alguém nos dizendo o que devemos ou deixamos de fazer, vai relegar as tais caixinhas a um grupo muito limitado de consumidor que, aposto, também as terá apenas para dizer que tem, e raramente irá usá-las. Já as demais manifestações de IA, e bem mais discretas, vão continuar crescendo, sendo debatidas e consumidas: seus aspectos na IoT (Internet das Coisas), nos projetos de Cidades Inteligentes (chuto aqui que também será um tema bastante abordado durante o ano) e, principalmente, na substituição de atividades profissionais, principalmente daquelas que se julgavam seguras com a tal educação formal que dissertei no item acima.
Home Office: Vai, finalmente, cair a ficha e deixará de ser chique: afinal, esse tal de home office é uma enganação, uma maneira de precarizar o trabalho ainda mais, passar boa parte dos custos fixos para os funcionários, e ainda pagar menos (afinal, não tem mais custos com transporte e alimentação). O problema é que a ficha caiu tarde demais, as empresas não querem que você volte para o escritório agora que ele está desocupado e o dono do imóvel colocou a cortina mais popular do país (aquela que vem escrito do lado de fora 'Aluga-se'). Para aqueles que ainda vão a um ambiente 'bater ponto', será em um lugar mais discreto (empresas tomaram horror de placas e qualquer coisa que demonstre ostentação), onde o gerente só está esperando a turma do TI (tecnologia de informação) terminar um novo software (usando IA) que possa eliminar mais x% de postos atuais de trabalho. Ou seja, o home office, os co-working, os escritórios compartilhados ainda continuarão, em si, em alta. Em mim, é que não vou achar mais tão sofisticado assim.
Empregos: A má notícia: muitas e muitas pessoas continuarão a perder seus empregos formais e informais para as novas tecnologias. Mas, repito, não é novidade e em toda revolução tecnológica é esse desastre social. Era de supor que, tendo uma sociedade com preocupação de bem estar social mais desenvolvida, poderíamos ter soluções para isso, embora ainda não esteja enxergando e não acredito que 2020 irá ajudar muito nessa questão. Mas uma boa e parcial boa notícia é que, como nas demais revoluções tecnológicas, novos especialistas serão necessários para as novas atividades que vão surgir, e algumas delas vão despontar em 2020. O problema é que serão ainda poucas as escolas formais antenadas nessa nova necessidade de formação, embora o número irá crescer no ano, discretamente, e, depois, de forma exponencial. Isso se as pessoas não derem uma banana para o sistema educacional e resolverem por si próprias (como defendi acima). Outra tendência que irá se confirmar em 2020, mais pelo mundo do que aqui, é o mesmo fenômeno discreto que acontece em outros momentos de mudança tecnológica: vai diminuir o tempo de trabalho. Cada vez menos teremos oito horas diárias. Mas isso não é tão bom quanto parece, pois irá também diminuir a remuneração e é certo que os mais vulneráveis economicamente terão menos de oito horas formais, mas terão que aumentar em muito o seu informal, ou o seu 'empreendedorismo', a maneira hipócrita que alguns chamam os sofridos e instáveis bicos e nanonegócios dos mais pobres. Por outro lado, a ampliação de horas de ócio será daquelas oportunidades de criação dos tais novos empregos que a revolução tecnológica irá proporcionar, principalmente nas áreas da saúde, da educação e do lazer.
LGPD: outra temática que vai repercutir bem em 2020, mas em um círculo mais fechado. Como toda legislação, ela vem já a partir de uma mudança de paradigma que vem rolando nos últimos anos: fiquei esperto e sei que vocês usam os meus dados para muito mais coisas do que imaginava, a maioria sem meu conhecimento, ganhando muito dinheiro com isso e, de alguma maneira, me prejudicando. Ou seja, a nova legislação será fruto da superação da ingenuidade da sociedade de que só existe internet e redes sociais do bem. Uma importante diferença para as temáticas anteriores é que essa percepção negativa de tudo que envolve a rede mundial de computadores atinge, praticamente, todas as camadas sociais, fazendo dela o veículo com menos credibilidade. Com a ostensividade com que nos chegam mensagens no telefone, telemarketing aos sábados, emails com promoções sobre algo que acabei de comentar, o 'basta' se avoluma. Não é toa que 2019 já pontuava notícias sobre proibição de sistemas de reconhecimento facial no mundo, um sistema que, até pouco tempo atrás, era admirado por sua tecnologia e elevado à condição de um instrumento essencial para a segurança social. Bobagem, dizem as pessoas, é um instrumento que, antes de mais nada, invade a minha própria segurança social! Vai ser divertido acompanhar o jogo de forças que envolverá o debate dessa legislação.
5G: Esquece! O Brasil não irá andar um passo sequer. E ficará, mais uma vez, fora de uma série de avanços tecnológicos. Será reviver o que aconteceu com a TV a cores e a TV Digital, além da maldita reserva de mercado da informática nos anos 1980 a 1990. Aqui vai entrar nossa vocação de marido motorista mal humorado que não aceita que ninguém lhe sugira nada: "eu sei o caminho", é o que ele responde algumas horas antes de notar que está perdido. Talvez sirva para mudarmos de ideia em 2022... Coloco aqui um jabuti internacional: sabe o tal computador quântico? Então, 2020 também não vai ser o seu ano.
Redes Sociais: Não sei o que virá, mas mudará radicalmente. Desde o falecido Orkut, passando pelo Facebook e agora o Instagram, a ordem das coisas é assim: os jovens, ávidos, descobrem um meio, popularizam (em todas as camadas sociais), se divertem e, quando veem que os pais e tios começam a entrar, pulam para outro lugar (tá certo, sempre foi um saco os pais vigiarem o que a gente está conversando.....). Pois, recentemente entrei para o Instagram. Para onde, então, vai a galera? Sei lá, eu sou o tio que está chegando....
Televisão aberta: o pobre terá cada vez menos televisão. A gratuita, aquela que nós crescemos acreditando que era assim, na vida, no mundo. Pois bem, a realidade chegou aqui, e o que já acontecia nos Estados Unidos desde meados do século passado, e em países irmãos como Portugal, já neste século, consolida-se: se quiser ver TV, pague! Com o fortalecimento do negócio do Globoplay, a chegada de novas plataformas como a Apple +, a televisão deixou de ser oferecida para ser demandada. Quem tiver recursos, irá pagar duas, três, quatro assinaturas para ver seus programas preferidos, e ainda terá que pagar internet por isso. "Ah, mas é barato", dirão alguns, provavelmente quem não pega ônibus e nem recebe menos de um salário mínimo, como 60% dos trabalhadores brasileiros. Abre-se mais um dos fossos sociais e culturais: quem tem recursos, verá, cada vez mais, uma variedade imensa de programas, séries, noticiários, eventos. Quem não tem, continuará com a podre programação de jornalismo sensacionalista ou tradicionais telejornais que só repercutem o que a internet reverberou durante o dia; programas de auditório preconceituosos e que raramente acrescentam na vida das pessoas, quando não deprimentes (ou não é uma sacanagem a Ana Maria Braga dar uma receita de salmão gratinado para uma população que briga para comprar carne de segunda algumas vezes por mês?). Filmes velhos, ruins, desconhecidos e repetidos que me lembram aquelas prateleiras empoeiradas das extintas locadoras. Programas infantis já foram expulsos, para serem monetizados nas TVs pagas. Esporte, então, só faz sacanagens, do tipo transmitir em Recife Palmeiras e Flamengo quando boa parte queria ver Sport e Naútico (paga no Premiere, então!). O que resta de positivo são as novelas, porque estão mais rápidas, plasticamente mais bonitas, e mais sintonizadas no atual momento social, tudo isso mais preocupadas em atender o público das plataformas pagas, é claro. Aqui, o problema é a defasagem, a comodidade e a temporalidade, já que o assinante pode ver antes, pode ver depois, de novo, e em qualquer lugar e aparelho. A doninha com assinatura dará spoiler no salão só para mostrar que pode?
TV Digital: até a propósito do dito acima, ela é que deveria ser a redenção da TV aberta, já que tem mais canais, qualidade melhor de transmissão... Esquece! Ninguém mais vai falar de TV Digital. Está posta aí e é isso, se quiserem! A TV Digital terminou o ano de 2019 não chegando a 30% da população e esse número continuará assim. Ao zapear (esse termo ainda existe?) nos novos canais, que deveria, em tese, ser um contraponto à TV paga e oferecer variedade e cor local às transmissões, se encontra, em uma assustadora maioria, televisões religiosas. Um descalabro de difícil mensuração, pois, pela Constituição, são concessões públicas e, como qualquer concessão pública, deveriam ser laica e proibidas da ancoragem em uma só vertente dogmática. Ou seja, a TV Digital, além de não ter atingido nenhuma das suas potencialidades sociais (interatividade, abrangência, multiprogramação, ampliação de oferta de canais, surgimento de emissoras locais) é um mosaico a céu aberto de descaso à lei.
TV Pública: até a propósito dos dois itens ditos acima, deveria ser o local para que essas questões pudessem ser mitigadas. Que a TV Pública, federal, estaduais, municipais, universitárias, comunitárias, legislativas, educativas, ocupassem então o lugar da variedade de programação, dos programas infantis, da diversidade cultural, do local, da Festa dos Reis a Orquestra Sinfônica. Tudo indica que será um ano para mantê-las no seu anonimato, quando não dentro de uma campanha de extermínio. No entanto, não acredito em sua extinção, pois a turma que as mantêm tem problemas com previsões.
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